Doenças do trânsito são lembranças doloridas

Maus hábitos ao volante, carros desregulados e estresse no trânsito adoecem motoristas

tráfego duplo, por Hodachrome

“trânsito duplo”, por Hodachrome

Dirigir é uma atividade de risco. E não apenas pela possibilidade de acidentes. Segundo especialistas em medicina de trânsito, o simples dia a dia frente ao volante pode trazer vários problemas de saúde. O perigo se esconde desde ações aparentemente inofensivas, como trocas de marcha feitas com o braço na posição errada – que podem gerar lesões no pulso e em outras articulações –, até estresse pós-traumático que atinge pessoas que presenciam ou se envolvem em acidentes de trânsito.

LEIA A MATÉRIA COMPLETA

Muitas chegam a ter dificuldades no trabalho, de relacionamento, tendência ao alcoolismo e depressão. “Nesses casos é necessário um acompanhamento, já que estes sintomas podem demorar até quatro meses para aparecer”, orienta Raquel Almqvist, especialista em trânsito do departamento de psicologia de tráfego da Abramet – Associação Brasileira de Medicina de Tráfego.

A tensão causada pelo trânsito e pelo risco de assaltos também contribui para o aparecimento de doenças. “Todos os condutores estão sujeitos a riscos variados. No final do dia, um motorista submetido a condições estressantes é capaz de sofrer tontura, problemas de audição, dores de cabeça e no corpo, entre outros problemas”, diagnostica o Dr. Henrique Naoki Shimabukuro, membro do Departamento de Medicina de Tráfego da Associação Paulista de Medicina.

O próprio veículo compromete a qualidade de vida dos motoristas. A trepidação de um motor desregulado pode, por exemplo, causar contraturas musculares e fadiga intensa. Além disso, a vibração ainda prejudica as articulações do joelho, do cotovelo e dos ombros. Outro perigo rotineiro é o barulho dos motores, que põe em risco a audição de quem está dentro do veículo. “O motorista recebe em média 87 decibéis, enquanto a legislação preconiza que esse ruído seja de, no máximo, 85 decibéis. Em casos extremos, esta exposição aos ruídos pode acarretar a perda total da audição”, adverte o Dr. Dirceu Rodrigues Alves Jr., chefe do departamento de Medicina de Tráfego Ocupacional e diretor da Abramet.

Alguns problemas seriam evitados com cuidados simples. Como prestar atenção na posição correta de sentar, já que má postura afeta a coluna. “O ideal é que o motorista sente com um ângulo de 90 graus entre a coluna e as pernas. O banco não pode estar muito para frente ou para trás”, esclarece o Dr. Maurício de Moraes, do Instituto de Ortopedia e Traumatologia de São Paulo. O braço totalmente esticado para segurar no volante é outro erro, pois gera tensão nos ombros, cotovelos e pulsos.

Também há uma maneira correta de se pegar no volante. “Recomenda-se que as mãos no volante estejam na posição chamada 9:15, como os ponteiros do relógio”, complementa o Dr. Dirceu Rodrigues Alves Jr. Até pouco tempo atrás a posição indicada era a 13:50 – também chamada de 10 para as 2. Hoje, por conta da bolsa do airbag, a posição de segurar no volante mudou para não afetar seu enchimento em uma possível colisão.

Atitudes rotineiras aparentemente insignificantes também requerem atenção do motorista. A troca de marchas é um exemplo. A ação deve ser feita com a mão reta. A troca de forma errada, em casos extremos, pode levar a uma doença chamada síndrome do túnel do carpo. “Neste caso o motorista sofre dor, alterações da sensibilidade ou formigamentos no punho”, avisa o Dr. Dirceu Rodrigues Alves Jr.

Como se não bastassem todos esses problemas, o motorista ainda está à mercê de situações que fogem ao seu controle. Os riscos biológicos são um exemplo. Os carros naturalmente turbilhonam as poeiras do solo, recheadas de microorganismos e de produtos químicos, que invadem o habitáculo. Essa poeira acaba sendo ingerida ou inalada pelo motorista e passageiros. Nela estão bactérias e fungos que afetam as defesas do organismo. Isso sem contar com a poluição do ar, que costuma ser mais intensa em grandes engarrafamentos. “As doenças respiratórias são caracterizadas por um processo inflamatório crônico das mucosas das vias aéreas. Elas pioram com a exposição aos agentes químicos da poluição”, explica o alergista Fábio Morato Castro, da Universidade de São Paulo. Um estudo da própria Faculdade de Medicina da USP aponta que, apenas na cidade de São Paulo, morrem, em média, 12 pessoas por dia devido à poluição, encurtando a vida média do paulistano em um ano e meio. Uma dica dos especialistas é, dentro do possível, sair de casa fora dos horários de pico e evitar as vias com maior concentração de automóveis. Ações simples, mas importantes em relação a melhoria da qualidade de vida dos motoristas.

Instantâneas  

# Os maiores problemas causados pela poluição são no aparelho respiratório, como sinusite, rinite alérgica, bronquite, asma e enfisema pulmonar, além de conjuntivite, irritação nos olhos e nas mucosas.

# O estresse é praticamente inevitável, mas exercícios físicos e aeróbicos podem contribuir para uma melhor qualidade de vida.

# Pessoas com estresse pós-traumático podem ser tratadas com terapia ou/e remédios.

# Dirigir um carro sem ar-condicionado sob o sol forte pode causar desidratação. Nestas situações o aconselhável é que o condutor utilize roupas leves e beba bastante água.

Muita calma nessa hora

O estresse é um carona mais que indesejado. Cada vez mais presente em razão do aumento da frota de carros e dos congestionamentos, este mal moderno é praticamente inevitável. “Hoje o tempo é muito precioso. E a perda desse tempo no trânsito leva a irritação, impaciência e agressividade”, explica Raquel Almqvist, especialista em trânsito do departamento de psicologia de tráfego da Abramet. As consequências físicas são variadas. Entre elas,  mal-estar, dor de cabeça, gastrite, alterações de humor e da pressão sanguínea.

O estresse, em seu ápice, pode provocar desequilíbrio emocional. Mas o trânsito em si não é o grande vilão. Na verdade ele funciona como uma válvula de escape. “A pessoa acumula problemas em seu dia a dia e acaba extravasando no trânsito, onde se sente protegida e vê o veículo como uma espécie de armadura”, revela Raquel Almqvist. Dentro do veículo existe uma condição induzida psicologicamente. Dependendo do que o motorista faz, ele não é identificado de imediato e se sente anônimoe até protegido graças a sua “armadura de metal”.

Além do estresse psicológico, os motoristas e passageiros ainda sofrem o estresse físico e social. “O fato de estar longe da família e correndo risco de assaltos e sequestros também afeta a qualidade de vida destes indivíduos”, acrescenta  o Dr. Dirceu Rodrigues Alves Jr., chefe do departamento de Medicina de Tráfego Ocupacional e diretor da Abramet. Uma das formas de evitar o estresse diário para quem dirige muito é a prática de exercícios físicos e aeróbicos. “Se o estresse é inevitável, é necessário aprender a extravasá-lo e voltar a condição normal” orienta Raquel Almqvist.

fonte: Marcelo Cosentino. revista Auto Press

Comments are closed.