“Me demiti porque queria poder desligar o celular”

Outro dia numa conversa numa roda de mães uma delas contava como tinha se demitido do emprego. Tinha participado de uma reunião até tarde da noite. No percurso para casa esqueceu de ligar o celular.

picjumbo.com_IMG_7460

Quando chegou em casa deixou a bolsa no móvel da sala e foi até o quarto, onde a babá fazia as crianças dormirem. Deitou-se ao lado delas, num misto de culpa e alívio por ter chegado a tempo de vê-las acordadas e adormeceu.

CONTINUE LENDO A MATÉRIA

No dia seguinte, ao ligar o celular, a surpresa: recados na caixa postal, whatsapp e e-mail denunciavam que seu chefe tinha tentado contato sem sucesso madrugada adentro.
“Na hora achei extremamente invasivo, mas depois comecei a suar frio. Sabia a pressão que estava dentro da empresa com as demissões por conta da crise, o acúmulo de funções e fiquei com medo. Medo de perder o emprego, inclusive. Só que não tinha coragem de ligar de volta”, contou aos prantos.

Seu peito começou a apertar “Fiquei com medo de ter um infarto de tanto nervoso. E aí recobrei os sentidos. Não era justo que eu me sentisse culpada por ter chegado em casa às 21h e dormido com o celular desligado. Não era eu quem deveria mudar. Era ele. E percebi que se continuasse naquele ritmo ia acabar assim, mostrando que eu estava totalmente disponível para a empresa, quando na verdade não queria ter essa disponibilidade. Já achava um absurdo chegar em casa a noite e só ter tempo de ver as crianças indo deitar”.

Naquele dia quando chegou ao trabalho, seu chefe ainda não estava lá. Ela fez o que precisava ser feito e quando ele chegou ela pediu um momento a sós com ele.
“Você está ciente de que deixou suas obrigações e nem respondeu meus e-mails?”, ele perguntou.

Antes de começar uma discussão ela percebeu o absurdo que acontecia ali. E se para ter aquele emprego ela precisaria estar disponível 24 horas por dia, resolveu que dinheiro nenhum pagaria a quantidade de horas que passava longe dos filhos. “Eu não estava pedindo para sair as seis da tarde. Que aliás, era meu horário de saída. Eu estava negociando poder desligar o celular depois das 22 horas. E quando me dei conta do absurdo que era aquilo, fui honesta e disse que não queria mais trabalhar ali”.

O chefe, que sabia da sua capacidade, entrou em pânico. Principalmente porque reconhecia a péssima gestão que tinha ocasionado a perda de sua melhor funcionária.

Mas esse não foi o primeiro e nem será o último relato de uma mãe que é massacrada no mercado de trabalho. A diferença é que se tornou tão comum cobrar essa disponibilidade 24 horas por dia, como se isso fosse sinônimo de ‘comprometimento’, que as pessoas não entendem a distorção de valores que as empresas têm feito.

Se por um lado empresas no mundo todo investem em políticas que façam com que os funcionários sintam-se mais felizes, inclusive com políticas ‘familyfriendly‘ que possibilitem momentos de lazer ao lado da família diariamente, por outro, um número crescente de ‘desesperados’ perderam a mão. Como disse uma amiga certa vez, ‘as empresas assinam a carteira e acham que compraram a alma do funcionário”.

O que aconteceu com a mãe cuja história relatei aqui no começo do texto é que ela resolveu usar seu expertise para abrir e gerir seu próprio negócio. “Pelo menos eu administro a minha disponibilidade e eu colho os resultado

Infelizmente a maioria destas mães, por medo de retaliações, acabam não dando nome aos bois. Mas felizmente muitas delas se deram conta de que esse não é o caminho. E estão construindo uma nova história.

Fonte: Mãe at work – Fotografia: Viktor Hanacek

Comments are closed.