Consumo de álcool disparou na pandemia, especialmente entre mulheres jovens

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Beth L. (nome fictício) costumava gostar de tomar um drinque com o marido no final do dia, quando voltava do trabalho e depois de colocar o bebê para dormir. Mas tudo mudou durante a pandemia.

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“De repente, não existia mais ‘voltar do trabalho’, porque eu estava trabalhando em casa, além de estar tentando cuidar de uma criança de 11 meses”, lembra Beth, que permanece trabalhando de casa na maioria dos dias.

Ela começou a tomar seus drinques mais cedo.

“Eu só precisava de um pouco de coragem, na forma da bebida, para me ajudar a enfrentar o dia enquanto eu tentava fazer malabarismos com o bebê, cumprindo prazos editoriais e tarefas domésticas”, diz ela.

 

Beth não está sozinha. Vários estudos apontaram para um aumento no consumo de álcool desde o início da pandemia.

E embora o uso de álcool tenha aumentado entre homens e mulheres, cada vez mais pesquisas indicam uma tendência progressiva de uso de álcool por mulheres – especialmente jovens, de acordo com um relatório realizado pelo Ria Health , um programa on-line de tratamento da dependência de álcool.

Beth não está sozinha. Vários estudos apontaram para um aumento no consumo de álcool desde o início da pandemia.

E embora o uso de álcool tenha aumentado entre homens e mulheres, cada vez mais pesquisas indicam uma tendência progressiva de uso de álcool por mulheres – especialmente jovens, de acordo com um relatório realizado pelo Ria Health , um programa on-line de tratamento da dependência de álcool.

“Fizemos uma pesquisa entre os nossos participantes porque queríamos ver como os padrões de consumo mudaram ao longo da covid-19”, disse o Dr. John Mendelson, médico e diretor clínico do Ria Health.

“Identificamos que o maior aumento se deu entre mulheres com filhos menores de cinco anos de idade, que estavam em casa. Essa população dobrou ou triplicou a ingestão de bebida. Observamos a nossa população de pacientes e vimos um grande aumento de inscrições de mulheres com menos de 40 anos de idade, que são um número substancial”, afirmou.

Beber para enfrentar

“A bebida já foi vista como algo que afeta principalmente os homens, mas isso mudou”, disse o Dr. John. “O universo da bebida de nossas avós era mais restrito. As mulheres não podiam votar ou ter empregos – era um ‘mundo masculino’ – e a expectativa depositada nas mulheres era diferente”.

 Hoje, não só as mulheres são uma parte fundamental da força de trabalho, mas “também costumam ser as responsáveis pela casa e pelos filhos, o que aumenta o nível de estresse”, disse ele.

Muito do consumo de álcool pelas mulheres de hoje é motivado pelo estresse.

 “Há um mito de que o consumo excessivo de álcool ocorre principalmente em situações sociais, mas a maioria das nossas pacientes bebe sozinha”, destacou o Dr. John.

Durante a pandemia, a combinação de isolamento, estresse relacionado ao trabalho e criação dos filhos recaiu de forma mais intensa sobre as mulheres.

 “O combo de tentar arrumar o que fazer com as crianças e ter um bom desempenho profissional estando socialmente isolado e tendo um volume maior de responsabilidades é algo realmente difícil”, disse ele.

“Há evidências de que a prevalência do consumo de álcool pelas mulheres já vinha aumentando antes da pandemia”, explicou a Dra. Katie Witkiewitz, Ph.D., professora de psicologia da University of New Mexico, nos Estados Unidos.

Mas, aparentemente, o impacto da pandemia foi maior nas mulheres no que diz respeito a sofrimento, e como a ingestão alcoólica associada ao enfrentamento do estresse é relacionada com ingestão pesada, podemos esperar que mais mulheres estejam bebendo para lidar com o sofrimento”, disse a Dra. Katie, que também é cientista do Center on Alcohol, Substance Use, and Addictions (CASAA) da University of New Mexico, nos Estados Unidos.
O estresse “tornou-se quase insuportável”, compartilhou Beth. “Um dia, o bebê estava chorando, eu estava cozinhando, deixe um pote de molho de espaguete cair e eu tinha um artigo para editar. E daí que eram 10 da manhã? Eu precisava beber naquele momento”.

Ela diz: Há um grande abismo entre cinco da tarde e dez da manhã, em que não dá mais para chamar de ‘tomar um drinque’, e eu caí nesse abismo.

Cultura do “suco da mamãe”

Gillian Tietz, uma bioquímica que está se recuperando do alcoolismo, diz que o uso de álcool se tornou mais normalizado durante a pandemia como uma forma de as mulheres – especialmente as mães jovens – lidarem com as dificuldades de ser mãe, e muitas vezes esposa e profissional, durante a pandemia.

“Na minha experiência, as mulheres normalmente bebem por razões negativas – para evitar ansiedade, estresse ou lidar com casamentos ruins, em vez de por razões positivas, como socializar com amigos, e esse tipo de consumo de bebida normalmente é solitário”, disse Gillian, que é anfitriã e criadora do podcast Sober Powered .

Ela observa que, durante a pandemia nos Estados Unidos, se viam mais taças de vinho, canecas e mercadorias semelhantes com memes como “Meus filhos berram, então eu bebo”. Um comercial de televisão retratou uma mãe abrindo uma mini geladeira secreta no banheiro para beber suco e champanhe.

“Esconder-se no banheiro para beber é um sinal de alerta e não há nada de engraçado nisso”, disse Gillian, observando que normalizar o consumo de bebidas alcoólicas como uma forma de lidar com o estresse relacionado à maternidade pode reduzir a capacidade de percepção dessas mulheres de que elas podem estar tendo um problema com álcool e de que precisam de ajuda.

Buscando ajuda

“Um dos mitos muito propagados em relação ao consumo de álcool é de que a maioria das pessoas nega que tenha algum problema ou se recusa a receber tratamento”, diz o Dr. John, explicando que, os dados epidemiológicos e as suas observações na verdade mostram que quando as pessoas sabem que estão apresentando um novo problema e têm boas opções de tratamento disponíveis, elas correm atrás.
 As pessoas reconhecem o problema e procuram ajuda por vários motivos. Por exemplo, o Dr. John diz que alguns pacientes procuraram ajuda quando pararam de se lembrar de conversas com familiares.

Beth reconheceu que tinha um problema com o álcool quando deixou seu bebê cair.

“Felizmente, aconteceu no chão acarpetado do quarto, e o bebê está bem, mas me abalou e eu precisei admitir que havia um problema e que eu precisava de ajuda”, contou.

A Dra. Katie sugere começar com “autoavaliação e monitoramento do consumo de álcool” e recomenda as informações dos Centers for Disease Control and Prevention (CDC).

“Sugiro estabelecer limites e reduzir o consumo de álcool – por exemplo, reduzir em uma a duas doses cada vez que beber ou reduzir o número de dias de consumo por semana”, diz ela.

Outras dicas de redução podem ser encontradas aqui .

Reconhecer o problema é o primeiro passo. A questão é o que fazer depois disso. Felizmente, existem muitas opções.

Medicação e coaching: o modelo do Ria

Quando Debbie K (nome fictício), gerente de projetos de TI, esposa e mãe de uma filha pré-adolescente, começou a trabalhar em casa durante a pandemia, passou a beber cada vez mais cedo e continuava a beber até ir se deitar.

“Esse padrão acontecia com frequência e percebi que precisava parar com esse hábito”, disse ela.

Debbie recorreu ao Ria, que usa telemedicina, medicação baseada em evidências, treinamento de recuperação, aconselhamento médico, grupos de apoio e ferramentas digitais – incluindo um aplicativo e um dispositivo móvel para testar o nível de álcool no sangue – e personaliza sua abordagem às necessidades de cada cliente. O programa é totalmente remoto e coberto por alguns planos de saúde, explicou o Dr. John.

Debbie gostou do coaching individualizado, das sessões em grupo e do componente médico.

“Ter uma checagem com um coach e supervisão médica torna o programa mais estruturado, um sistema, que é o que eu precisava”, diz ela.

Ela também gostou de não precisar ter como objetivo a abstinência.

“Um dos motivos pelo qual eu não quis ir para o Alcoólicos Anônimos (AA) é que você precisa parar de beber imediatamente, o que pode ser o melhor para algumas pessoas, mas eu gostei de poder reduzir lentamente o meu consumo de álcool, continuar usando minha medicação e tomar apenas dois drinks. Não é uma interrupção abrupta”, disse Debbie.

Redução e moderação não funcionam para todo mundo, diz Gillian.

“Eu tentei moderação por cinco anos, e claramente não era o caminho para mim. Algumas pessoas têm que parar totalmente”, disse ela.

Livre das amarras

Beth considerou o AA e SmartRecovery – ambos os quais ela acessou on-line – úteis.

“Gosto de saber que o alcoolismo é uma doença, e milhares de pessoas conseguiram superá-la e se libertar das amarras do alcoolismo”, disse ela. “Fui a reuniões on-line e consegui um padrinho. Tenho uma nova comunidade de pessoas como eu e nos entendemos”.

Gillian também considerou o AA útil, assim como o Luckiest Club , um fórum de suporte on-line.

Ela também mencionou um recurso importante, o Sober Mom Squad , que oferece “apoio de mãe para mãe”.

Mais recursos e grupos de apoio podem ser encontrados no site da American Society of Addiction Medicine . A Dra. Katie recomenda várias opções, incluindo Ria e Checkup & Choices .

Gillian diz que a psicoterapia a ajudou muito.

“Eu disse a mim mesma por anos que eu não bebia para lidar com nada, que eu não estava tentando escapar de traumas ou fracassos; mas quando finalmente parei de verdade, senti raiva e emergiram sentimentos de toda sorte”, disse ela. “Percebi que tinha usado o álcool para entorpecer esses sentimentos e que nunca havia aprendido estratégias para lidar com nada. A terapia me ajudou a entender por que me sinto assim, o que me faz explodir de raiva e como lidar com isso”.

Foto da capa: Orna Wachman para Pixabay

Fontes: Medscape

Beth L.

Alkermes: “The Harris Poll: Insights Into Drinking Behaviors During the Pandemic.”

International Journal of Environmental Research and Public Health: “Alcohol Consumption during the COVID-19 Pandemic: A Cross-Sectional Survey of US Adults.”

Front Public Health: “Alcohol Consumption and Perceptions of Health Risks During COVID-19: A Qualitative Study of Middle-Aged Women in South Australia.”

Dr. John Mendelson, director clínico, Ria Health.

Dra. Katie Witkiewitz, Ph.D., professora regente de psicologia, University of New Mexico; pesquisadora, Center on Alcohol, Substance Use, and Addictions.

American Journal of Psychology: “The World Health Organization Risk Drinking Levels Measure of Alcohol Consumption: Prevalence and Health Correlates in Nationally Representative Surveys of U.S. Adults, 2001-2002 and 2012-2013.”

Alcoholism: Clinical and Experimental Research: “Alcohol and Women: A Brief Overview.”

Gillian Tietz, bioquímica; criadora e anfitriã do Sober Powered podcast.

Rethinking Drinking: “Do you enjoy a drink now and then?”

Debbie K.

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